Desenvolvedores do Bitcoin apresentaram uma proposta inédita e potencialmente disruptiva para blindar a rede contra ataques futuros de computadores quânticos. O plano, submetido em 14 de julho por nomes de peso como Jameson Lopp, estabelece um cronograma em três fases para substituir os atuais esquemas criptográficos por alternativas resistentes à computação quântica.
O documento, intitulado Post Quantum Migration and Legacy Signature Sunset, surge como resposta ao avanço dos algoritmos quânticos e à possibilidade concreta de que, entre cinco e dez anos, essas máquinas sejam capazes de quebrar sistemas hoje considerados seguros, como ECDSA e Schnorr. Há quem estime que o chamado “Dia Q” possa chegar já em 2027. Caso isso ocorra, qualquer carteira que tenha exposto sua chave pública na blockchain poderá ser invadida — inclusive as associadas a Satoshi Nakamoto.
A proposta estabelece três etapas de transição. A Fase A pretende impedir que novos bitcoins sejam enviados para endereços baseados em criptografia vulnerável, estimulando a adoção dos chamados endereços pós-quânticos (P2QRH). Já a Fase B, mais radical, invalidaria completamente as transações feitas com esquemas legados a partir de um bloco determinado, o que congelaria os fundos de quem não realizar a migração a tempo. Por fim, a Fase C — ainda em estudo — prevê um mecanismo de recuperação por meio de provas de conhecimento zero, permitindo que usuários comprovem a posse de frases-semente mesmo após o prazo.
Segundo o rascunho, cerca de 4,9 milhões de BTC — o equivalente a US$ 593 bilhões — estão atualmente em formatos de endereço considerados frágeis, como Pay-to-Public-Key (P2PK) e endereços que reutilizam chaves. Nesse grupo, estão incluídos os cerca de 1 milhão de bitcoins atribuídos ao criador do protocolo.
Os autores argumentam que, ao estabelecer uma data-limite para adoção do novo padrão, criam-se os incentivos corretos para que indivíduos e instituições ajam com urgência. O texto é direto: “Se não atualizar, você perderá o acesso aos seus fundos.” Além disso, alertam que um ataque quântico bem-sucedido pode ser silencioso e indetectável até que seja tarde demais, comprometendo toda a confiança na rede.
Embora o hardware quântico ainda esteja em estágio inicial, os avanços recentes na área de algoritmos e a homologação de esquemas pós-quânticos pelo NIST em 2024 reforçam a urgência do tema. A proposta reconhece o histórico lento do Bitcoin para implementar mudanças, e propõe um prazo de cinco anos para a adoção plena, buscando consenso em torno de um “dia de corte” bem definido.
Ainda em fase preliminar, o plano precisa da aprovação da comunidade para ser adotado. No entanto, representa o esforço mais robusto e articulado até hoje para preparar o Bitcoin para a era da computação quântica — e pode inaugurar um marco na história da rede: a desativação permanente de moedas não migradas para padrões de segurança mais avançados.